Uma das etapas da viagem era subir, de barco, o lago Tanganika, que fica no norte da Zambia. Como o barco era so dia 24, andei a empatar tempo durante duas semanas, entre o Zimbabwe e South Luangwa. Mas ja estava na hora, e meti-me a caminho do norte da Zambia.
Deixei o parque de South Luangwa de aviao, de regresso a Lusaka. Aproveitei uma modalidade muito simpatica que a Zambia Air tem, que se chama Stand-by ticket. Vamos para o aeroporto uma hora antes do voo. Se sobrarem lugares no aviao, o bilhete fica por 60$. Isto sim, e' organizacao e optimizacao(pelo menos fizeram um passageiro feliz)! Com 3 voos diarios, um tinha que ter um lugar. Foi logo no primeiro.
No aviao ia tambem, por coincidencia, um dos guias do parque, que ia de ferias para outro parque na Zambia. Como ficava a caminho, cravei boleia. E assim fiz a primeira parte do percurso de Discovery. Ainda deu para ver uma parte de Lusaka que nao conhecia, mais desenvolvida e moderna (afinal a cidade ate' e' engracada), e depois fazer 500 kms de caminho. Ja de noite, deixaram-me numa pequena vila, de seu nome Serenje. Agarrei o primeiro motel que apareceu, e eles partiram. Acho que de noite, todos os moteis parecem manhosos. Mas 'aquela hora tambem nao podia ir procurar mais. Mas ate era simpatico, e pelos vistos eu era o unico cliente. Dia seguinte, procurar autocarro para a cidade seguinte. Perguntei no motel, e o recepcionista disse que em Serenje so parava uma camioneta, a dos Correios, que ia para Kasama. A dos Correios? Sim, a dos Correios. E onde e' que apanho a camioneta dos Correios? Nos Correios!(estupido...). E muito simpatico, veio de taxi comigo para me mostrar onde era. E realmente, la estava o posto dos Correios, e la comprei o bilhete para o autocarro dos Correios! Deve ser para ir no meio das cartas e das encomendas, imaginei.
Ainda tive tempo para dar uma voltinha na vila, so com uma rua, lojas dos dois lados, quase todas de productos agricolas, mercearias, e de telemoveis. Os telemoveis sao muito importantes em Africa! Levantei dinheiro no Multibanco (pois e', ate este ermo tem multibanco!) e voltei para os Correios. La chegou, e afinal era uma camioneta normal (embora bastante velha). Mas como o "porao" ia cheio de correio, as malas iam nos ultimos bancos, ainda vazios. Ao contrario das outras viagens, nesta os meus companheiros de viagem eram ali da zona, todos agricultores ou afins. A senhora ao meu lado, ja de idade, mas ainda com ar de quem todos os dias trabalha no campo e carrega com muita coisa 'a cabeca. E foi entao que tive mais um dos momentos de "globalizacao", quando a senhora, debaixo das suas roupas africanas, muito simples porque nao tinha aspecto de ter dinheiro para mais, tira um telemovel igual ao meu e liga para alguem. Nokia, mesmo modelo, mesma cor. Ver uma pessoa tao diferente de mim, de um meio que nao podia ser mais distante do meu, usar exactamente o mesmo telelmovel, fez-me sentir realmente que o mundo esta' pequeno, muito pequeno. Em qualquer parte do mundo, em qualquer profissao, hoje em dia, usamos os mesmos telemoveis, bebemos as mesmas bebidas, vemos os mesmos programas (na Zambia passa actualmente uma telenovela brasileira da globo).
Como chegamos a Kasama ja tarde, fiquei ai nessa noite. Uma guest-house muito simpatica, com uns belos jardins de uns senhores ingleses ja com 40 anos de Zambia, que ate gritaram com o taxista que me levou la, porque pelos vistos me estava a pedir um balurdio. Eu e' que fui estupido, que so' perguntei o preco depois de entrar no taxi, e nao antes. Depois queixo-me de ser chulado!
Dia seguinte, apanhei um mini-bus (um candongueiro, para quem conhece), para fazer o percurso final ate ao lago. Uma daquelas Hiaces onde deviam ir 12 pessoas, mas vao 20! Isto claro, sem contar com os bebes de colo, que ha sempre pelo menos 3 ou 4. Quando arrancou ate iamos poucos (uns 14), mas ele fez questao de dar a volta 'a cidade ate encontrar passageiros para fazer numero redondo. Viagem sem problemas. De vez em quando para mudar de posicao la pedia ao parceiro do lado, e ele tambem se mexia, e acabava toda a gente la dentro a mudar de posicao. Ao fim de 50 paragens para entrarem e sairem passageiros, la chegamos ao destino: Mpulungo! Mpulungo fica nas margens do lago Tanganika, que e' um dos maiores do mundo, e o mais profundo. Finalmente chegar, e ver outra vez agua como se fosse o mar, foi uma sensacao maravilhosa, quase de liberdade! Fiquei num lodgezinho, Nkupi Lodge, com cabanas individuais simples, mas limpas e arejadas. Soube a 5 estrelas, depois daquela viagem! No mini-bus comigo vinham dois americanos, um deles que trabalha no PeaceCorps. Para quem nao sabe (eu nao sabia), o Peace Corps e' um servico de voluntariado americano, organizado pelo governo, que envia jovens durante 2 a 4 anos para uma qualquer parte do mundo, para ajudarem populacoes locais. Este amigo estava numa aldeia no meio da Zambia, com outro colega, a viverem numa cabana igual 'a da restante populacao, e so ia a casa no final dos 2 anos! E no's ainda nos queixamos da vida de expatriado em Angola! (Eu agora, de longe, posso mandar estas bocas!)
Depois de instalados fomos beber uma cerveja 'a beira-lago, e ainda ver o por do sol. Ainda tentamos comprar peixe aos pescadores, mas peixe fresco, so de manha, pois claro!
Dia seguinte, alugamos um taxi entre os 3, e fomos visitar as quedas de agua de Kalambo, que, com os seus 200 metros de altura, sao as segundas mais altas do continente. Duas horas de carro por estradas de terra muito ma's, e la chegamos. Um pequeno rio, mas que, quando se atira do precipicio abaixo, se transforma numa cascata enorme. La embaixo, muito la em baixo, vemos onde aterra, no meio de um vale rodeado de escarpas. Tiramos algumas fotografias e, como nos tinham dito que podiamos tomar banho, fomos mandar um mergulho. A poucos metros da queda, pe ante pe, la nos metemos na agua. A corrente relativamente forte, com medo de sermos arrastados, foi um primeiro voluntario 'a frente (e' sempre o portugues, pois claro), agarrado pelo americano, ate' perder pe. La ganhou coragem e comecou a nadar para a outra margem, contra a corrente. Afinal nao era assim tao dificil! Podem vir, seus americanos maricas!Do outro lado dava para ir ate ao bordo do precipicio, entre dois bracos de agua e olhar mesmo para baixo, e ver a agua a desaparecer no abismo. Ficamos ali quase uma hora, so a ver a paisagem, a ouvir o trovao da agua, a aquecer ao sol, a sentir o vento que subia pelo precipicio acima, vento quente e forte. Os 5 sentidos inundados, isolados no meio de Africa...
Entretanto, la apareceu o Elvis para irmos embora. Elvis era o nome do taxista. 'A noite jantamos um peixinho que o Scot tinha comprado no mercado de manha (pois claro), e que a senhora do hotel preparou. No lodge estavam mais duas suecas, de 19 anos, que tambem andavam a viajar por Africa, da Namibia ate ao Quenia. Duas meninas loirinhas, de 19 aninhos, a viajar sozinhas, sao a prova de que qualquer pessoa, homem ou mulher, velho ou novo, pode viajar perfeitamente por Africa. E que a unica coisa que custa e' o primeiro passo, o de meter-se 'a estrada! O barco, o venerando MV Liemba, chegava no dia seguinte ao porto. Podia ser 'as 4 da manha, podia ser ao meio dia. Em caso de duvida, toca a deitar cedo.
'As 6 da manha fui ate ao porto, mas do barco, nada. Disseram-me que entre atracar, descarregar, e partir, deveria levar umas 4 horas. E que quando chegasse, o apito ouvia-se em toda a cidade. Aproveitei para subir 'a cidade, escrever um bocado no meu blog, comprar comida, cortar o cabelo (achei que a ocasiao exigia), e quando estava a chegar ao Lodge, que era em frente ao lago, la ouvi o apito do Liemba. Eu e as suecas metemo-nos no taxi directos ao porto. Tratamos dos papeis da fronteira, passamos pelo meio da multidao de gente que comprava e vendia os produtos que o barco trazia (peixe, arroz, etc), e entramos no barco, 'a procura do senhor que em principio nos ia vender os bilhetes. 'A nossa frente tinhamos 3 dias de viagem, a subir o lago mais comprido do mundo, num barco com 100 anos de idade!
Ganda Ricardo!!!
ResponderEliminarSempre que leio mais um post teu, lembro-me do telefonema que te fiz para saber se valia a pena ir para Renne ou não (e ambos sabemos que valeu ;)). Cada post parece mais um empurrao para apanhar o primeiro voo para a ino'spita Africa, e deambular contigo estrada fora sem saber ao certo o dia de amanha.
Já agora podias informar os teus seguidores qual o percurso que pensas fazer. Basta um mapa com uma simples linha ate' ao PORTO.
"Viajar e' nascer e morrer a todo o instante"
Grande abraço
Lui's
estou a gostar muito de ler! :)
ResponderEliminarboa viagem!
e continua a "inundar os 5 sentidos"!