sábado, 27 de agosto de 2011

A grande surpresa da viagem

Passei pela Etiopia só porque estava no caminho para o Egipto. Não tinha interesse para mim. E assim descobri o país mais fascinante e surpreendente da minha travessia.

Cheguei ao hotel às 7 da manhã. Fui directo dormir e, depois de um almoço rápido, saí para comprar um cartao SIM e passear pela cidade. Ia eu pela rua fora quando dois rapazes etíopes, nos seus 20 anos, vêm falar comigo. A conversa de sempre: de onde és? como te chamas? o que procuras? podemos ajudar? Somos estudantes e estamos de férias, só queremos praticar ingles. Com o cansaço que levava nem me quis chatear e deixei que me acompanhassem na caminhada. Descemos a avenida principal de Addis-Ababa, e eles começam com a conversa que aquele era um dia especial, em que toda a gente se juntava para beber chá e comer khat (fosse lá o que isso fosse). Passamos por um pequeno bar e convidam-me para entrar só para ver. Normalmente mando-os dar uma curva, mas eram simpaticos e nao tinha nada que fazer por isso entrei para ver. Um bar pequenino com várias mesas baixas, com pessoas a fumar shisha e a comer umas plantinhas. Sentamo-nos numa mesa, onde ja estava mais gente, e eles pediram o khat. Vieram entao uns ramos cortados, ainda verdes, com folhas. De cada ramo, cortávamos e comiamos as folhas. O ambiente e as pessoas eram simpaticas, as plantas sem sabor especial mas era um passatempo engraçado, como comer tremoços ou amendoins. Uma boa desculpa para conversa. Ficámos 4 horas à mesa, a falar, beber chá e comer folhas. Durante as conversas fui percebendo: a planta é tipica da Etiopia, consumida por todo o pais, e tem um pequeno efeito estimulante: deixa-nos relaxados, sem cansaco, e bem dispostos. Só com 3 horas de sono, e estava fresco como uma alface. Descobri depois que a plantinha era proibida nos EUA, embora legal na Europa.
Juntaram-se a nós mais 2 amigos que estavam na mesa connosco, e de taxi fomos a um bar de música tradicional, ao vivo. Um tambor e uma especie de violino deitavam uma música meio àrabe, meio africana. Duas dançarinas e uma cantora, passeavam pela pequena sala a cantar e a desafiar as pessoas. Os meus "guias" encomendaram uma grande panqueca  (injera) com carne, molhos e vegetais lá no meio. Mal o grande prato aterrou na mesa, começaram todos a arrancaram pedaços de panqueca que usavam para pegar no resto da comida. Na Etiopia não há talheres nem pauzinhos.
Já de estomago cheio, saltámos para outro bar de música ao vivo. Aqui era só um artista com o seu sintetizador, mas estava toda a gente aos saltos, a dançar.
Depois de tanta música tradicional, os meus "amigos" decidiram ir a um sitio mais moderno. Acabámos numa discoteca, em que todas as clientes tinham aspecto de, apesar de ser uma da manhã, ainda estarem a trabalhar. E realmente, ainda estavam todas a trabalhar. Passado pouco tempo, os meus guias começaram a discutir entre eles, e foi cada um para seu lado. E assim acabei a apanhar o taxi sozinho para casa. O único senão da noite: durante todo o tempo, os meus "amigos" estavam também a trabalhar a carteira do turista. Como? Cada conta que vinha, em cada bar ou restaurante, vinha inflacionada. Como eu fazia questão de pagar as contas, que nao eram muito altas, eles iam amealhando a diferença. A noite acabou quando eles viram que o dinheiro era pouco para dividir pelos 4.
Dia seguinte acordei e resolvi ir passear a minha ressaca até à embaixada do Egipto. O primeiro guia que se meteu comigo na rua levou uma rosnadela antes de ter tempo de dizer olá. A embaixada do Egipto estava fechada por ser feriado no Egipto, por isso tive que esperar mais um dia para pedir o visto.
Dia seguinte, já sem ressaca, fui cedo à embaixada. Visto sem problemas, mas demora 4 dias úteis, mais o fim de semana pelo meio. Passei na Ethiopian Airlines e comprei um bilhete para Lalibela, a cidade das igrejas na pedra. Vôo nessa noite, às 5 da manhã (aqui parece que só gostam de descolar de noite...).
Nessa noite, depois de jantar, fui ver uma banda a um bar de jazz colado ao hotel. Durante uma fantástica actuação ao melhor estilo Fat Freddy's Drop, conheci dois músicos de jazz, que depois me convidaram para ir beber um copo a outro bar. Fizeram questão de me pagar as bebidas, como convidado que era, e despedimo-nos com promessas de falarmos quando eu regressasse. Afinal a Etiópia não tem só gente da má!

sábado, 13 de agosto de 2011

Nairobi

Acabada a aventura no Serengeti, dirigi-me para Arusha. Sair do parque implica atravessar as vastas planicies vulcanicas do sul, e depois subir ate ao topo das crateras dos vulcoes extintos. O mais famoso, o Ngorongoro, tem uma cratera com 20 kms de diametro, e um habitat no unico no seu interior. Mas eu ja tinha gasto todo o meu tempo, por isso so' paramos no topo da cratera para eu ver a nuvem que cobria toda a paisagem. No caminho, percorrendo a paisagem vulcanica, semi-desertica, varios grupos de Masai. Os Masai sao um tribo que ainda vive na sua maioria da sua ocupacao original, o gado. Vivem em pequenas aldeias em cabanas cercadas por arbustos para proteger o gado de predadores. Pela paisagem vem-se os trilhos deixados pelas manadas de bois que os Masai passeiam em busca de erva.
Deixei o meu guia e o meu cozinheiro numa pequena vila na fronteira do parque, e apanhei um candongueiro ate Arusha. Numa viagem de 100 kms, atravessamos uma paisagem salpicada de vulcoes e vastas planicies, com alguns lagos, cada um, um parque natural unico e independente, merecedor de uma visita particular.
Arusha serviu para dormir uma noite, e apanhar o autocarro no dia seguinte para Nairobi, capital do Quenia. A paisagem continuou igual, seca, totalmente plana com excepcao das montanhas-vulcao que acompanham toda a estrada. Uma das montanhas e' o Kilimanjaro, a mais alta de Africa, com 5895 metros de altitude. Por todo o lado vem-se Maisai, a maioria a passear os seus bois. Outros, parados na estrada 'a espera de turistas para tirarem fotos.
O autocarro pa'ra no centro de Nairobi. Centro moderno, com avenidas largas, jardins cuidados, edificios altos, dos anos 60 e 70. A cidade e' desenvolvida, moderna, funcional. Apanho um taxi ate ao Milimani Backpackers. Fica num bairro residencial, cheio de arvores, vivendas, e sem transito. O estilo de bairro residencial que vi no Zimbabwe. Sem duvida que os ingleses gostavam das suas colonias com muitas vivendas e jardins.
Para continuar viagem, precisava de obter o visto para a Etiopia na respectiva embaixada no Quenia. Nao tinha grande interesse na cidade, mas como cheguei num sabado, tinha que ficar pelo menos ate segunda, para poder indagar do visto. Tentei conhecer os segredos da cidade, mas, nao encontrei muitos. Vi uma cidade moderna, com bairros comerciais a fervilhar de vida, com as pessoas a entrarem e sairem de pequenas lojas que ocupam todo o espaco disponivel dos pisos terreos dos predios. No centro, uma classe moderna de executivos de fato e gravata, homens e mulheres com aspecto cosmopolita e ocupado. Uma cidade a querer ser moderna, cheia de actividade. O parque automovel moderno. Visitei tambem o maior musseque da cidade, Kibera, que dizem ser um dos maiores de Africa. Aproveitei uma visita organizada a uma escola, para conhecer o interior da zona mais pobre de Nairobi. Mais uma vez, tanto tempo em Luanda, e tenho que vir a outros paises para conhecer as favelas. O lixo e a pobreza estao por todo o lado. A maioria das barracas de terra e madeira, com cobertura de chapa. Mas as pessoas andam na sua vida, atarefadas, sorridentes. Ha mercearias, talhos, peixarias, mecanicos, postos de gasolina, escolas, tudo o que um pequeno bairro precisa. O limite da favela e' uma linha de comboio, que serve tambem de arteria principal de circulacao pedonal, com lojas dos dois lados. 6 vezes por dia o comercio para durante 2 minutos, para deixar passar o comboio. As restante vielas, em terra batida, tem todas um esgoto a correr pelo meio. O cheiro e' mau, mas nao impossivel. Visitamos a casa da nossa guia, onde vive com os pais e os 4 irmaos. Pequenina mas limpa, com uma sala e 2 quartos. Quando chove e' preciso semear baldes pela casa para apanhar as goteiras. Oico as tipicas historias de projectos do governo de realojamento, em que as casas em vez de irem para estes moradores, sao vendidas a favor de um qualquer funcionario do governo. A escola que vamos visitar foi montada depois da violencia das ultimas eleicoes, que deixou orfas varias criancas do bairro. As escolas oficiais, que em teoria sao gratuitas, custam dinheiro. Por isso esta escola, que vive 'a base de donativos, recebe criancas que nao tem quem lhes pague as "propinas".
Mais uma vez, como comparacao, este musseque e' bastante mais pequeno e civilizado do que os poucos flashes que eu vi dos musseques em Luanda. Angola ainda tem muito caminho para percorrer...
Como nota, a historia de um tal Pio Gama Pinto. Dizem que era Queniano, mas o nome nao engana. Lutou pela independencia do Quenia. Como bom portugues, deu o corpo ao manifesto, e agora tem o nobre titulo de "Primeiro politico assassinado do Quenia".
Segunda-feira acordei e fui directo 'a Embaixada da Etiopia. Ainda na Zambia, dois ciclistas suicos tinham-me avisado que aqui ja nao emitiam vistos. Confirmei. Vistos para a Etiopia, so para residentes no Quenia. Porque? Porque sim. Mas se quiser, pode apanhar o aviao, e no aeroporto, 'a chegada, emitem-lhe o visto imediatamente, sem problemas nenhuns. Ora aqui esta' a famosa logica dos vistos a funcionar. Podia dizer que e' a tipica logica africana, mas cheira-me que, em relacao a vistos, ha muita coisa estupida por esse mundo fora. Ainda perguntei se na fronteira me davam o visto. Claro que nao, que disparate!
Ainda perguntei no forum do Lonely Planet (uma das melhores fontes de informacao para viagens), mas alguem me respondeu que era impossivel conseguir o visto na fronteira. Desisti.
O percurso de Nairobi ate 'a fronteira com a Etiopia e' de longe o mais duro do caminho que tenho que percorrer. O norte do Quenia e' uma zona desertica, abandonada pelo governo. A estrada esta' num estado miseravel e, pior que isso, esta' carregada de bandidos somalis, que atacam os veiculos passantes. Os autocarros e camioes tem por habito juntarem-se em caravanas para percorrer este caminho, com guardas armados em cima dos camioes. Ainda por cima com a grande fome que afecta a somalia e o norte do Quenia, os bandidos devem estar especialmente desesperados.
Se fazer este caminho uma vez ja era mau, uma viagem de ida e volta ate' 'a fronteira, 3 dias para cada lado, era mau demais. Soube mais tarde que, um mes antes, um frances a viajar no proprio carro com a mulher, tinha levado um tiro que lhe furou a cara. Com estes argumentos tento justificar, perante a plateia, porque e' que a minha viagem atraves de Africa nao foi feita toda por terra. Espero que aceitem as minhas desculpas, prometo nao facilitar mais nenhuma vez.
Dia seguinte apanhei o aviao Narobi-Addis Ababa.
Aviao 'as 3 da manha, viagem de duas horas. Deixo para tras uma paisagem seca e quente, e aterro numa paisagem verde, coberta de nuvens carregadas. A uma altitude de 2300mts, e muito mais a norte que o Quenia, o tempo e' bastante mais fresco. Descubro que estamos numa das duas epocas anuais de chuvas, e nao ha um dia que nao chova. Depois de conhecer uma cidade moderna, ligada ao mundo, dou de caras com uma cidade atrasada, pobre, que nao sabe o que e' ou o que quer ser. Os carros sao todos velhos. Os taxis sao todos iguais: velhos Ladas, azuis, com ar de que nunca vao chegar ao destino. O taxista passa-me a macaneta da janela do lado do condutor para eu poder abrir a minha janela. Por todo o lado pequenos rebanhos de cabras, guiadas por pastores maltrapilhos, descalcos. O ceu permanentemente cinzento nao ajuda. Isto nao e' uma cidade alegre.



Para tras fica o Serengeti

Cratera vulcanica em Ngorongoro



O tuga assassinado









Posto de gsolina no musseque



Che', vem ai o comboio!

Mesma rua sem comboio

Mesma rua com comboio




segunda-feira, 8 de agosto de 2011

The greatest show on earth

Apos uma primeira noite num lodge simpatico (Mbalageti Lodge), com uma vista unica sobre as planicies infindaveis do Corredor Oeste do Serengeti, arrancamos cedo para mais um dia pelos trilhos do parque. O objectivo na minha cabeca, sempre, era ver as grandes manadas de gnus.
- Jonathan, onde vamos hoje?
- Vamos para Seronera, no centro do parque.
- Achas que vamos ver a grande migracao la'?
- Sim, la devemos ver.
Desconfiei um bocado, ja que por esta altura deviam andar mais pela zona oeste, e norte, mas ele e' que e' o guia...
Pouco tempo depois de sairmos, vemos um grupo grande, mas estavam longe, e como nao podemos sair dos trilhos, nao podemos proximar-nos. Por sorte, paramos mais 'a frente para ver outro pequeno grupo, e entretanto o grande grupo apanha-nos. Umas centenas de gnus e zebras. Quase a chegarem ao carro, uns quantos deles comecam a correr noutra direccao, e os outros vao todos atras. Em 5 minutos, centenas de animais desaparecem atras das arvores. Como nao podemos sair dos trilhos, perdemos os animais. Seguimos caminho. Vimos uma chita, a descansar 'a sombra. Mas eramos nos e mais 15 carros! Quanto mais nos aproximavamos do destino, mais animais apareciam, mas tambem mais carros. Vimos 2 leopardos numa arvore, nos e mais 10 carros. Fim do dia, dirigimo-nos para o acampamento. E' um parque de campismo aberto, sem vedacoes, no meio da planicie. Tem dois telheiros: um deles esta' cheio de cozinheiros, uns 20, ja que todos os grupos tem um cozinheiro. Estao todos numa grande azafama a preparar o jantar para os safarianos que estao a chegar do seu dia a comer po no parque. O outro telheiro e' onde sao colocadas as pequenas mesas de campismo para os clientes jantarem. Ao lado, as casas de banho, muito limpas, ha que confessar. Ajudo o meu guia a montar a minha tenda, no final do parque.
- Se quiseres ir 'a casa de banho durante a noite, leva lanterna, por causa das hienas.
- Oi? Das hienas?!?!
- Sim, durante a noite podem andar pelo meio das tendas, e convem levar lanterna para nao ser atacado.
Lembrei-me logo de ter lido no livro "Long Way Down", que um turista dormiu com a cabeca de fora da tenda, e as hienas lhe comeram a cabeca. Como nao estou a ver Com ou sem lanterna, ninguem me ia tirar da tenda durante a noite!
O meu cozinheiro (nao e' para todos, um cozinheiro privado!), fez um jantar rapido e simples, e depois da sobremesa atirei-me para dentro da tenda.
Eram umas 3 da manha, acordei. Barulho. A tenda nao era grande, a minha cabeca ficava quase a bater no topo da tenda. Ouvia barulho muito perto da minha cabeca. Passos? Vento?
As hienas sao ferozes, tem a mandibula mais poderosa de todos os predadores africanos, capaz de esmigalhar ossos sem esforco.
Abro a tenda para ver e me comerem a cabeca?
E com estes pensamentos tentei adormecer. Ou o cansaco era muito ou o medo nao era tanto, porque meia hora depois ja estava a ressonar.
Acordei antes do sol, e' a melhor altura para ver animais. Ganhei coragem e pus a cabeca de fora da tenda Ainda escuro, so' vi campistas, nada de hineas. Dei a volta 'a tenda 'a procura de pegadas. Nao encontrei nada de conclusivo, mas o que percebo eu de pegadas de hienas?! Se as hienas eram de verdade, nao sei. O medo era!
Arrancamos e 5 minutos na estrada passamos por um grupo de hienas, umas 10 incluindo 4 crias. La esta', como nao conseguiram comer nenhum turista durante a noite, estavam a atentar apanhar um leopardo que estava numa das arvores. Mais uma volta, vimos um rinoceronte e alguns elefantes, e regressamos ao acampamento, onde o meu (!!!) cozinheiro ja tinha um grande pequeno-almoco preparado.
Durante o dia, mais uma volta. Muitos carros, mas muitos animais tambem. Elefantes, girafas, zebras, impalas, hipopotamos. Fomos cada vez mais para sul. Planicies enormes, amarelas incandescentes, vazias.
- Jonathan, isto e' muito bonito, mas esta' vazio.
- Pois e'. E' a epoca seca.
- Pois, se calhar e' por isso que nao ha gnus aqui.
- Pois. Devem estar no norte.
- Mas nao disseste que iamos ver os gnus aqui?!?!
- Nao nao, e' a epoca seca, eles nao estao aqui, isto esta' seco!
Tenho a certeza que quem ja trabalhou em Africa acredita que esta conversa e' real. Por muito habituado que eu estivesse, fiquei fod.... Gastei uma pequena fortuna para ver a grande migracao, e este cab... andou a passear-me pelo lado contrario do parque! Tres dias a enganar o burro do turista!!!
- Olha la', o' meu ca.., desculpa, Jonathan, se formos ate ao norte do parque, achas que vemos a migracao? (a frase nao foi esta, mas a furia era equivalente)
- Provavelmente.
- E conseguimos ir e vir num dia?
- Sim sim, se sairmos cedo. Sao 150 kms ate la.
Pois bem, depois de muito pensar e insultar mentalmente, decidi que, perdido por cem, perdido por mil. Telefonei ao chefe dele, negociei mais um dia, e:
- OK Jonathan, Pago mais um dia. E se virmos o que eu quero, dou-te 50 dolares.
Os olhos do homem ate' brilharam! Dia seguinte, 'as 6 da manha, arrancamos para norte, a todo o gas!
Passamos por um grupo de leoes, mas nem abrandamos. Os animais iam desfilando 'a nossa volta, mas iamos sempre a apontar a norte. O parque comecou a ficar verde, mais gnus e zebras espalhados na paisagem. Os carros quase desapareceram, 2 ou 3 o caminho todo, em sentido contrario. Paramos so uma vez para ver dois girafoes a lutar, a mandar grandes pescocadas um no outro. Muito bizarro, como tudo o que envolve as girafas.
Ao fim de 3 horas de terra batida, chegamos ao final do parque. Montanhas verdes, vegetacao alta. Dai para a frente era o Quenia. No meio da montanha, o posto fronteirico, so' com dois tipos mal arranjados a fazer de guardas. O Jonathan foi perguntar se tinham visto os animais. Por 50$, um deles levava-nos a uma grande manada que ele tinha visto no dia anterior. 30$. OK, vou so trocar de roupa.
Vai ate' ao barracao, e regressa bem aprumadinho, com o seu fato verde de ranger, e espingarda ao ombro. Mete-se no carro e arrancamos, agora com a autoridade no carro. Primeiro trilho 'a direita, pelo meio da montanha. Tudo verde, muito verde 'a volta. Atravessamos uma colina, depois outra. O trilho mal se ve, andamos no meio da erva. Atravessamos mais um vale, mais outra colina, e entao comecam a aparecer...
Do alto da colina vemos um vale extenso, com centenas, milhares de animais. Todos espalhados, tranquilos, como se tivessem chegado ao paraiso dos gnus. A extensao da paisagem e' enorme, nao ha carros 'a vista. Nao paramos, andamos andamos andamos, sempre com animais 'a nossa volta. Sentia-me como se estivesse no Jurassic park, a ver os dinossauros pela primeira vez. Meu amigo, mereces os teus 50$, pensei eu.
Mas eles nao paravam, sempre a avancar. Havia mais. Ao fim de uma hora, ao passar uma colina, a paisagem muda instantaneamente para amarelo seco. E ao fundo, uma manada gigantesca!!! Primeiro uma fila enorme de gnus, a caminhar uns atras dos outros, cabeca baixa, como se fossem condenados a atravessar o deserto, sempre a andar, devagar, sem parar. Talvez 2 kms de fila indiana. Do outro lado da outra colina, a fila acaba num grupo grande de animais. Como se fosse agua, o fio de animais em movimento vai aumentando a poca no final. Na poca, os animais estao todos parados, sem saber para onde ir, virados para todos os lados. Ao longe, mais abaixo, outro grupo, ainda maior. Mas nesse grupo, de repente, alguns comecam a correr desenfreadamente. Na planicie, vejo-os a formar um triangulo, como se fosse a cavalaria a atacar. Depois, estica estica, ate que o triangulo se transforma numa linha na planicie, que vem em direccao ao primeiro grupo, onde nos estamos agora parados. E passado uns minutos os dois grandes grupos estao unidos por uma linha de animais a atravessar a planicie.
Nao sao os animais mais inteligentes do mundo. Uns vao para norte, outros para oeste, outros para sul. Parecem todos perdidos. Quando algum se atira por um caminho, alguns vao atras, e forma-se entao uma grande fila, nao interessa para onde vai. Do mesmo grupo, podem estar a sair animais em 3 ou 4 direccoes diferentes ao mesmo tempo. O que eles tem e' q andar.
Neste momento ja nao seguimos trilhos. Vantagens de ter a autoridade no carro connosco. Descemos ate ao grande grupo, e conduzimos no meio da manada. A toda a volta so vejo animais, gnus, todos a olhar para nos, mas sem se chatearem, sempre a mugir, uns para a frente, outros para tras. Saio do carro para aliviar a bexiga, e afasto-me um bocado. Estao todos a olhar para mim, como se fosse a coisa mais estranho que ja tinham visto. Volto para o carro e arrancamos. Passados 50 metros salta um leao do meio da erva alta, que quase que atropelavamos. O pobre estava escondido, a tentar apanhar um gnu. Se eu tivesse saido do carro mais 'a frente, o leao tinha-me atacado era a mim! E' por descuidos destes, e excesso de confianca, que os turistas sao mortos por animais selvagens. E eu besta, ia ser atacado sem sequer estar a ser filmado...
Andamos mais uma hora, sempre com grandes manadas de animais 'a volta, ate' chegarmos ao mitico rio Mara. Estamos na epoca seca e por isso o rio tem pouca agua. Os animais podem atravessar 'a vontade sem risco de serem atacados por crocodilos. Quando regressam para sul, uns meses depois, ja' cm a agua mais alta, e' que sao atacados. Onde paramos so vemos alguns hipopotamos. Saimos do carro e desco ate ao rio. Nao ha' erva alta, a visibilidade 'a nossa volta e' boa, e o ranger tem espingarda. Um dos hipopotamos levanta-se do rio e comeca a andar na minha direccao ameacadoramente. Vejo entao que esta uma cria no rio, e esta deve ser a mae chateada. Afasto-me da margem e a mae hipo acalma-se e deita-se outra vez na agua.
Missao cumprida, regressamos entao, pelos mesmos trilhos ja percorridos. Os gnus na zona seca ja la nao estao, ja saltaram mais uma colina. O vale verde ainda esta cheio de animais. Estes aqui ja encontraram o cantinho deles. Entretanto comeca a chover. Deixamos o nosso ranger na cabana dele, e fazemos-nos 'a estrada, de regresso ao acampamento. Cansados mas totalmente satisfeitos. O Jonathan confessa-me que nunca tinha visto nada assim.
Fotografias deste dia? Nao ha, ou quase. A camara digital ficou sem bateria no dia anterior, e o telemovel com camara estava nas ultimas. E no parque de campismo nao havia onde carregar. O meu ultimo rolo (sim, ainda tenho uma maquina de rolo), ja so tinha 6 fotografias. Um dos espectaculos mais impressionantes e emocionantes que ja vi, so' vai ficar guardado na minha memoria. Acreditem na historia se quiserem.


No caminho da manada

A familia do gatuno


Para nao acharem que estou em casa, a sacar as fotos da net
 
G-N-U: gnu!

Alguns gnus

Uma amostra de manada

Fotografia a preto e branco...

Sempre a dormir, os hipos.

Cu cu!!!

Vi uma chita, vi uma chita!

Camping


Hiena pela madrugada


A minha tendinha ao nascer do sol. Ao fundo, bufalos.



Elefantes na pradaria

Ha sempre alguem atras das minhas batatas






Tendas de luxo. Para quem quiser abrir os cordoes 'a bolsa.

A caminho do norte

Para norte!!!

Sozinhos no norte do Parque

Gnus por todo o lado


sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Sabor a Tanzania

De Kigali saltei para Mwanza, uma cidade nas margens do lago Victoria, ja na Tanzania.
Ate 'a fronteira a paisagem continua verde, montanhosa, cuidada. Ao aproximarmo-nos da fronteira, comecamos a descer. A fronteira fica no ponto onde acabam as montanhas e comecam as planicies. O verde e' substituido pelo amarelo e castanho, a terra preta passa a vermelha e cinzenta, seca.
O autocarro so’ vai ate’  ‘a fronteira. Atravesso uma ponte a pe, por cima das cataratas de Rusumo, e do outro lado, ja Tanzania, apanho outro autocarro.Vai ate' Kahama. A estrada esta' em obras, por isso temos que ir fora da estrada, num caminho improvisado em terra. Carros, camioes, carrinhas, trafico intenso. Muito, muito po'. As janelas da minha camioneta vao bem abertas para compensar a falta de ar condicionado. Acho que a minha roupa ficou toda da mesma cor, cor de po! Em Kahama, como umas espetadinhas e um café e apanho outro autocarro, este ja dos grandes com AC, directo a Mwanza. Chegamos 'as 8 da noite, salto para uma moto-taxi e em 5 minutos estou no Lake Hotel. Mwanza e' a segunda maior cidade da Tanzania, e o principal porto no lago Victoria. O lago Victoria e' ainda maior que o Tanganika, e' o segundo maior lago do mundo, e e' a fonte do Nilo Branco. O Nilo Azul nasce na Etiopia, e os dois juntam-se em Khartoum, Sudao, para desaguarem como um so' no Cairo. Daqui para a frente, o Nilo vai andar sempre a acompanhar-me na viagem, em branco, em azul, ou em mistura.
A cidade e' cativante pela quantidade de aves aquaticas que tem: garcas de todos os tamanhos e cores, pequenos guada-rios constantemente a mergulhar no lago, e muitos, muitos falcoes pescadores (imagino que este nao deve ser o nome cientifico). Sao centenas de falcoes, a voar pela cidade, e 'a noite, algumas arvores ficam carregadas deles. Com o tamanho das aves, parace que os ramos vao partir com anto peso. Com esta vida, jardins junto ao lago, e casas penduradas em colinas que mergulham no mar, a cidade e' das mais agradaveis e relaxadas por onde passei.
Mwanza tambem serve de porta de entrada num dos mais fabulosos locais de vida selvagem do mundo, o Serengeti. Com 14.763 km2 (Portugal tem 92.090km2), e' tambem um dos maiores. Talvez por causa da dimensao, os safaris sao organizados de forma diferente: a agencia de viagens aluga um carro, com guia e cozinheiro(!!!), e e' possivel ficar a dormir em parques de campismo espalhados pelo parque. Tambem ha muitos Lodges, mas sao muito mais caros do que dormir numa tendinha com os costados no chao rijo da savana. E passamos todo o dia a conduzir, 'a procura de animais, comendo onde nos apetecer. Como estou sozinho, e as agencias nao tem grupos nos proximos dias com quem me possa juntar, vou sozinho no carro com o guia. Tem a vantagem de poder ir para onde quiser, quando quiser.
O Serengeti tem uma quantidade extraordinaria de animais, e em especial de gnus. 1.300.000 gnus, 360.000 gazelas, 190.000 zebras fazem uma das mais espectaculares migracoes do mundo animal: na epoca das chuvas descem para o sul do parque para se alimentarem nas extensas planicies, verdes nessa altura. Quando comeca a epoca seca, vao para norte, onde esta’ a erva fresquinha. As famosas cenas de gnus a atravessarem o rio e a serem atacados por crocodilos acontecem neste parque. Depois de ja ter visto muitos animais na Zambia, eu queria mesmo era ver as grandes manadas de gnus, e as zebras que os acompanham. Agora estamos na epoca seca, em teoria estao a deslocar-se para norte.
Entramos no parque pelo lado oeste. Ao fim de 10 minutos aparecem centenas de zebras e gnus. Nas grandes planicies, vem-se grupos de animais, centenas deles. Uma verdadeira fartura. Aqui ha de tudo, mas em mais! Logo depois, grandes grupos de elefantes. Aqui, as girafas tambem andam em grandes grupos. Ver um grupo de 20 girafas a correr e' uma cena surreal, principalmente porque parecem que estao a correr em camara lenta. Mas com aquelas estacas nas pernas, correm mais rapido que os leoes!
Primeira noite ficamos num lodge neste lado do parque. O sol ja se esta' a por quando percorremos os ultimos quilometros. Planicies enormes, cobertas de erva seca, uma que outra zebra ao longe, ninguem 'a volta, so' a imensidao da planicie, com a cor do por-do-sol. E' especial. Como disse o Danny, o alemao amigo do Livingstone, o Serengeti pode ser uma experiencia mistica...

A verde Rwanda


Rusumo Falls - Fronteira Rwanda Tanzania

Adeus Rwanda

Ola Tanzania

Proxima camioneta

Espetadinhas na braza

Mwanza - o campo da bola sempre presente


Mwanza

O lagoVictoria, as pessoas, os passaros






Falcoes, muitos falcoes


Batatinhas, batatinhas!!!


Fui!

Girafas 'a sombra


Os primeiros gnus.